Diariamente recebo e-mail de pessoas que desejam viver de trading, mas
não sabem por onde começar ou como reverter sua situação perdedora. Eu adoraria
dar uma resposta simples, mas estamos falando de uma das profissões mais
complexas do mundo, por isso resolvi escrever um artigo sobre o assunto.
Quando digo que esta é uma das profissões mais complexas do mundo, não
estou exagerando. Não digo que é uma profissão complexa para me gabar e gritar
meus feitos. Digo isto porque conheço pessoas de todas as áreas possíveis (até
pessoas sem formação) que largaram suas profissões originais para se tornarem
traders, além daquelas que já começaram a sua vida profissional no trading. Poucas
área no mundo concentram tamanha diversidade de mentes. Além disso, o trading
varia muito conforme o mercado, país, horário, contexto macro, política, e tipo
do trader (se é institucional, autônomo, de tesouraria, de asset, etc). Por
isso, esta leitura pode ser mais longa do que você encontra habitualmente no
mundo trader, mas prometo fazer valer cada palavra!
O mercado financeiro é altamente complexo, e esta complexidade evidencia
o quão fantástico ele pode ser. Mas estamos falando de um ambiente altamente
competitivo, portanto, quem deseja entrar neste jogo precisa estar mentalmente
preparado para agir no campo da alta performance, como um atleta de elite. Você
pode cursar engenharia, administração, direito, medicina ou qualquer outra
atividade e encontrar um bom lugar no mercado de trabalho sendo um profissional
mediano, mas no trading, o mediano é eliminado a duras perdas, operação após
operação. E novamente não estou exagerando.
Talvez você já tenha ouvido falar que o desempenho dos traders pode ser
expressado numa curva normal, mas se você não está familiarizado com
estatística podemos simplificar dizendo que: 5% dos traders, desistem antes
mesmo de tentar, seja por falta de conhecimento ou insegurança; 90% dos traders
são inconsistentes, ou seja, ganham num dia, perdem no outro, e na melhor das
hipóteses empatam com a renda fixa. Muitos deste amplo grupo possuem bom
conhecimento técnico, mas faltam “alguns pequenos ajustes”, principalmente de
mindset, que irei comentar mais adiante; apenas os 5% da ponta final desta
curva são traders consistentes e por isso são denominados Trader Nível Três, ou
simplesmente TNT. Portanto, torno a dizer:
quem
deseja entrar neste jogo precisa estar mentalmente preparado para agir em alta
performance
. Terá que alinhar seu estilo de vida e a forma como vê as
coisas, como encara riscos e oportunidades, e como lida com cenários
desfavoráveis.
Se você, que estava esperando colocar seu dinheiro na bolsa e ganhar
muito em pouco tempo, achou que a afirmação acima é um balde de água fria,
considere isto um favor, pois acabo de te poupar um bom dinheiro. Por favor,
não me interprete como arrogante, pois estou apenas apresentando alguns pontos
importantes para que você não perca dinheiro no mercado desnecessariamente. Por
outro lado, também não precisa jogar tudo para o alto e desistir de investir o
seu dinheiro com qualidade (ninguém merece ter seu próprio patrimônio
malcuidado!), pois é possível render melhor do que a poupança, que os CDBs
medíocres oferecidos pelos bancos e outros investimentos “furados” – através de
bons produtos de renda fixa e sem correr riscos. Entenda que um trader
eficiente não é necessariamente a pessoa que executa centenas de operações por
dia, mas sim, cuida do seu patrimônio com os recursos que estiverem ao seu
alcance.
Levei algum tempo para compreender que o trading vai muito além de
dominar uma boa técnica, mesmo tendo bons mentores no meu início de mercado. O
caminho não é trivial e justamente por isso faço questão de compartilhar a
minha visão com você. Me ensinaram desde cedo que não viverei o suficiente para
cometer todos os erros do mundo e aprender com o erro dos outros sai mais
barato. Então, a seguir resumirei alguns dos meus maiores enganos que cometi
durante meus primeiros passos, para que você não precise levar os tombos que eu
levei.
No início, e por um bom tempo, a minha busca por consistência nos
resultados se resumia na seguinte afirmação: “eu só preciso de uma boa técnica
para obter resultados no mercado”. Ledo engano! Cada vez que descobria uma nova
técnica e pensava “agora sim, encontrei o caminho das pedras”, bastava algumas
operações (às vezes algumas semanas) para ver que aquela técnica, sozinha, não
ia resolver os meus problemas. Mesmo “fazendo alguns ajustes para refinar a
técnica”, o Santo Graal nunca era alcançado. Perdi as contas das vezes que
pensei que ia ficar rico e me frustrei em seguida. Foi assim com as penny
stocks na NASDAQ, quando teve a onda de IPOs na Bovespa em 2008, quando
descobri as travas com opções de diferentes vencimentos, etc. Mas, apesar dos
insucessos, eu era incansável! Fui atrás de especialistas, sentei ao lado de
traders consistentes, embora não conseguisse “copiar” seus modelos vencedores,
e assim fui construindo o meu caminho.
Claro que na época eu ainda não me dava conta de que meu mindset estava errado, mas felizmente a
minha atitude foi produtiva, pois através desta busca incessante eu fui
naturalmente conhecendo muitas táticas, tipos de operação e mercados, de tal
forma que meu repertório de conhecimento técnico foi aumentando. Mais
importante do que isto, neste processo fui conhecendo pessoas, principalmente
através de cursos. Sem isto eu jamais teria condições de desenvolver minhas
próprias estratégias, pois estas dependem diretamente das experiências que
passei, cursos que fiz, livros que li e conversas que tive com outros traders.
Aí, num belo dia, caiu a ficha: um cozinheiro que dispõe de uma ampla gama de
ingredientes terá mais condições de executar pratos mais elaborados, e da mesma
forma, um trader que conhecer múltiplas técnicas, entender o funcionamento de
diferentes tipos de mercado e operações, terá melhores condições de se adaptar
às mudanças de dinâmica do mercado. Ficou muito claro que o trader que se fecha
para uma técnica só, vai ficar perdido quando o mercado mudar sua dinâmica e a
técnica dele não funcionar mais – às vezes volta a dar resultados, mas demora,
e às vezes simplesmente nunca mais volta a funcionar. Neste mundo não é
permitido permanecer passivo, na esperança de que o mercado se adapte a você, e
na verdade acontece o contrário, ou seja, somos nós que estamos constantemente
buscando nos adaptar às mudanças de comportamento do mercado.
Com cerca de 2 anos de trading
eu já havia operado com ótima consistência os papéis da NASDAQ e NYSE e me vi
obrigado a mudar o foco de atuação, porque não estava mais conseguindo
performar. Hoje vejo claramente que foi uma decisão muito acertada quando
decidi mudar o mercado de atuação assim que os bons resultados deixaram de
aparecer. Isto me forçou a conhecer melhor o mercado brasileiro e sua
infinidade de possibilidades: contratos futuros, agrícolas, operações a termo,
papéis ON e PN (lá fora não tem essa distinção), gestão de carteiras e teoria
de Markowitz, opções, operações estruturadas, sem falar nas novas técnicas de
análise e ferramentas. Foi nesta época que comecei a aprender análise técnica,
incluindo a parte baseada em correlação, e também tive contato com outras
ferramentas do mercado como a cobiçada plataforma da Bloomberg (que ainda hoje
custa uns US$2.000 por mês). Meu repertório de técnicas aumentou
consideravelmente, contudo, mesmo dominando muitas táticas um trader ainda não
vai, necessariamente, criar uma boa estratégia. E que fique claro, técnica e
estratégia são coisas diferentes.
Imagine que eu proponha um desafio para 10 pessoas: cruzar o Brasil de
Porto Alegre até Manaus e quem chegar primeiro, ganha R$10.000,00. É possível
utilizar diversas técnicas como ir a pé, de bicicleta, com carro próprio, de
carona, de ônibus, de avião, de barco, etc. Mas leve em consideração que cada
concorrente será deixado no ponto de partida com apenas R$200,00 no bolso. Para
vencer, é necessário desenvolver uma estratégia, em que, além da combinação de
técnicas, outros cenários são levados em consideração, como orçamento
disponível, como obter mais recursos, velocidade de deslocamento e custo dos
transportes. Enquanto uma pessoa pode pensar em cruzar o país pegando carona
com caminhoneiros, outra pode decidir comprar doces e vender em algum semáforo
movimentado até conseguir dinheiro para comprar a passagem de avião. Portanto a
estratégia varia de uma pessoa para outra.
No trading é ainda mais complexo, pois além das táticas, a estratégia
precisa levar em consideração tópicos individuais como a situação patrimonial,
disponibilidade de tempo, paciência, impulsividade, disciplina, tolerância a
perdas, objetivos de vida predisposição para estudar, eficiência em aprender,
etc. Por isso, estratégia é algo que não se copia e mesmo quando sentei do lado
de outro trader, não consegui operar como ele. Sempre haverá a componente
pessoal que contribui para moldar o que chamo de DNA operacional. O repertório
de técnicas não deixa de ser extremamente relevante, mas é importante deixar
claro que outras componentes são igualmente essenciais. Quem entende este ponto
e se concentra em desenvolver seu próprio jeito de operar, utilizando
características próprias a seu favor, terá melhores chances de se adaptar à
complexidade do mercado.
Um excelente exemplo disso foi um trader chamado William Delbert Gann, hoje
conhecido pelos “Ciclos de Gann” e considerado um dos traders mais bem-sucedidos
da história. Ele foi um operador de commodities que desenvolveu um jeito
próprio de analisar o mercado, baseado em ciclos temporais e fazendo uso de
astrologia, que era algo com o que ele se identificava. Não quero entrar no mérito
da veracidade de suas conquistas, nem na validade de seu método, mas o fato
dele atuar no mercado levando em consideração seus aspectos pessoais, em vez de
copiar outros trader, certamente contribuiu para que ele desenvolvesse um
estilo único. O mercado é tão complexo que nele é possível inúmeros indivíduos
expressarem suas particularidades e ainda obterem sucesso, mesmo trilhando caminhos
diferentes. A diferença entre meu estilo e dos meus colegas do Portal do Trader
é uma evidência clara disso. Aliás, eu diria que o mercado “premia” quem leva
em consideração suas próprias particularidades na hora de compor a sua própria
estratégia.
No entanto, nem todo mundo está preparado para atuar num ambiente tão “livre”
assim e por isso tenta a todo custo terceirizar esta responsabilidade, numa tentativa
frustrada de clonar estratégias. Pura perda de tempo. Nestes mais de 10 anos de
experiência, nunca conheci um trader que se deu bem no longo prazo somente seguindo
dicas dos outros. Compartilhar e receber pontos de vista é extremamente
importante, mas é preciso ter um senso crítico próprio para julgar e executar as
operações que precisam ser feitas.
Portanto, se você está começando no mercado, trate de aprender as
principais técnicas e só depois que formar esta base, procure se especializar
nas técnicas que mais se identificou. Não tente se especializar logo de cara,
pois isto não funciona em nenhuma profissão. Médicos, engenheiros,
administradores, veterinários, entre outros profissionais, buscam primeiro uma
graduação para depois se especializarem em alguma área específica, não o
contrário. Ninguém constrói um prédio a partir do topo, mas sim a partir da
base. E isto leva tempo, mas se comparado com uma profissão comum – em que se
cursa uma faculdade ao longo de 5 anos, depois ainda gasta mais uns 2 anos em
especializações – a profissão trader até que promete resultados rápidos. Mas
rápido não quer dizer instantâneo. Costumo dizer que “um trader leva cerca de 2
anos para se tornar bom da noite para o dia”.
Muita gente se engana diariamente comprando um método milagroso, pensando
que aquilo vai trazer resultados logo de cara. E quem vende este tipo de ilusão
sabe muito bem que a indústria do resultado imediato é extremamente lucrativa,
por isso o mercado está cheio de cursos que mais parecem aqueles métodos de
emagrecimento rápido. Mas não me entenda mal, eu acredito que é necessário sim
fazer cursos (mais de um!), ler livros e conhecer outras pessoas no mesmo
caminho, só que no início é importante focar na abrangência, para só depois se
especializar. É tudo fruto de um processo. Faz sentido, certo?
Até 2014 eu costumava dar coachings individuais, mas percebi que apenas
aqueles que tinham um perfil condizente com o meu tiravam bons proveitos dos
ensinamentos. Me dei conta que a minha visão, mesmo com tudo o que já tinha
juntado de bagagem, ainda era restrita se comparada com as inúmeras
possibilidades do mercado. A única forma de melhorar o meu curso era me unir a
outros especialistas, que complementassem o meu estilo operacional e
apresentassem outros pontos de vista. Foi esta percepção que me motivou a
fundar, junto de outros especialistas, o
Portal do Trader, um ambiente em que
eu poderia aumentar o meu networking e em que, através de múltiplas abordagens,
promovesse o desenvolvimento de um amplo repertório de técnicas para os
frequentantes. E entenda que técnicas vão muito além de métodos de análise de
mercado. Elas ainda incluem: aspectos referentes à psicologia do trader e toda
a parte comportamental, basicamente para moldar atitude e comportamento; gestão
de risco que, além dos diversos tipos de stops, inclui a parte de alocação patrimonial;
ciência da alta performance, porque o trader não pode se dar o luxo de ser “ok”,
ele precisa estar acima da média; e principalmente planejamento, também chamado
de
Trading Plan.
É no planejamento onde se encontra a estratégia detalhada. Ele é como se
fosse o passo a passo do trader rumo ao sucesso (ou pelo menos não rumo ao
fracasso, já que nele constam os limites aceitáveis caso o plano não dê certo)
e uma forma dele se manter consistente ao longo do tempo. Isto tudo parece
complexo, mas posso dizer é que mais trabalhoso do que complexo. Por isso, é
preciso gostar deste mercado, assim os estudos não se tornam uma tarefa árdua.
E sim, é preciso estudar bastante, sempre! Se este não é seu perfil, trate de
mudar, ou você será só mais uma sardinha desorientada no meio dos tubarões. Eu
compro cursos, livros, mantenho um networking e contrato coachings até hoje,
pois esta me parece ser a melhor forma de me manter uma sardinha melhor precavida
contra tubarões.
A esta altura acredito que ficou claro que se você quer embarcar na
profissão trader, vai ter que investir (literalmente!). E não tem como escapar
da necessidade de dinheiro, pois este é o nosso combustível. Um trader sem dinheiro
é como um chefe de cozinha sem ingredientes. Ele não é capaz de produzir nada. Não
estou dizendo que precisa de uma pequena fortuna para começar, mas é preciso
algum capital, ainda que seu objetivo seja operar com o dinheiro dos outros.
Aliás, eu mesmo fui um exemplo disso.
Comecei minha carreira numa mesa proprietária, basicamente uma empresa
que disponibiliza seu capital para traders selecionados operarem e dividirem o
lucro. Mas até ser admitido nela eu tive que passar por alguns testes, operando
no mercado real. E ainda que eu não estivesse colocando o meu dinheiro nas
operações, eu precisava ter capital para me manter e pagar as minhas contas
básicas no período em que estava tentando bater a meta de contratação. Também
precisava de capital para investir em cursos, ou seja, investir em mim mesmo.
Por isso, quando comecei esta jornada, tinha um pequeno pé de meia (R$20 mil
reais que guardei com os estágios, monitorias e iniciação científica ao longo
da minha graduação). Isso é mais ou menos como a vida de um concurseiro ou
vestibulando, que deixa de trabalhar em qualquer outra atividade e passa a se
dedicar
full time ao principal
objetivo: ser aprovado no processo seletivo.
Como dá para perceber, esta jornada não foi fácil para mim. Comecei sem
muito dinheiro, como muitos começam (e sem “paitrocínio”), tive altos e baixos,
mas fui persistente e dedicado. Além disso, entendi a tempo, antes de quebrar,
o
mindset básico de um trader que
nada mais é do que encarar esta atividade como um constante processo de
aprendizado, um laboratório, em que: 1. Criamos ou reformulamos uma hipótese;
2. Testamos/aplicamos ela; e 3. avaliamos os resultados e voltamos ao início do
ciclo. Esta é uma metodologia simples para promover melhoria contínua, mas uma
vez que entendemos a sua lógica, passamos a aplicar não só no mercado, mas em
todas as outras áreas de nossas vidas, como relacionamento, saúde, alimentação,
lazer, etc. A partir disso começamos a agir e pensar voltados para a arte da
alta performance. Quando cheguei neste ponto, me dei conta de que o trading não
é uma simples atividade, mas um estilo de vida. Ele te ensina a ser eficiente
em múltiplos campos, simplesmente porque a lógica da vida é tão complexa quanto
a do mercado.
Eu ainda poderia me estender muito mais, mas acredito que já tenha
ficado claro que, se você quer seguir a profissão trader, vai ter que adequar a
sua visão, além de ralar muito. Não existe atalho, por isso, quem ganha
dinheiro neste mercado, independentemente do quanto seja, merece cada centavo!
E como diria Jesse Livermore, um dos maiores traders de todos os tempos, “este
mercado é fantástico, mas não é para aventureiros. Estes irão todos morrer pobres!”.
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Boas reflexões e a gente se vê no mercado!